sábado, dezembro 17, 2005

Rameswaram - Banho sagrado numa ilha paradisiaca

O dia 1 de Dezembro marca o ponto a partir do qual comecamos a imprimir ah viagem uma velocidade de cruzeiro. Nesta data, apanhamos um autocarro ate Allepey e daqui seguimos para Kollam, a bordo de um barquinho preguicoso que nos transporta por entre as veias de aguas calmas e doces do Kerala. Durante as sete horas de viagem assistimos as rotinas diarias de quem vive nas margens e aqui lava as roupas e as loicas das refeicoes, pesca o jantar, da banho aos filhos e ate mantem pequenos cubiculos forrados a palhota e assentes em estacas de madeira que nos pareceram ser latrinas com esgoto directo. A paisagem eh magnifica e os patos nadam em bandos enormes, indiferentes aos receios de gripes ou outras maleitas. Nos aproveitamos para dormir, ler e apenas estar ali. Ah hora de almoco, paramos num sitio a meio do caminho onde nos servem um thali em folha de bananeira. Enquanto empurramos o arroz com o chapati, sem a ajuda de garfos ou facas, conhecemos um casal de franceses que esta agora a terminar uma viagem semelhante ah que nos pretendemos fazer, iniciada ha cerca de 10 meses.
De Kollam seguimos para Madurai, ja no Estado de Tamil Nadu. Chegamos de manha cedinho, ainda os estabelecimentos estao fechados. Dirigimo-nos aos templos (motivo por que fazemos escala nesta cidade) e encontramos uma extraordinaria estrutura com 65 mil metros quadrados, decorada com mais de 30 mil pequenas estatuas coloridas, representando deuses. Os templos atraem cerca de 10 mil pessoas diariamente, mas nos vimos muito poucos ocidentais. Descalcos, percorremos o intrincado de ruas sujas interiores.
Nessa mesma manha, apanhamos um autocarro para Rameswaram. O mar azul da pequenina ilha com vista para o Sri Lanka cativa-nos logo ah chegada. Aqui, os nossos sentidos descansam, finalmente, e deixam-se entorpecer pela beleza muito pouco adulterada pelo homem.
Na madrugada de domingo, 4 de Dezembro, somos acordados por uma violenta tempestade. Lembramo-nos que Tamil Nadu tem estado, nesses dias, sob o efeito de fortes chuvadas inesperadas, deixando campos alagados e culturas destruidas. Mesmo assim, levantamo-nos cedo e vamos para o templo. Na praia junto ao hotel onde estamos alojados, encontramos dezenas de pessoas que ai, na Baia de Bengala, iniciam os seus rituais com um banho purficador. Nos nem sequer molhamos os pes na agua salgada. Estamos secos, mas isso nao dura muito tempo. O chao do templo esta alagado e ficamos com agua enlameada pelos tornezelos. Poucos minutos depois, e quase sem me dar conta do esta a acontecer, dou inicio a um longo ritual composto por 24 baldes de agua sagrada, que me sao deitados pela cabeca abaixo. Depois do primeiro banho (eu julgava que os nao-hindus so poderiam ser aspergidos com salpicos de agua), tentei desistir. Mas o guia nao admite essa hipotese e continua a chamar-me, de poco em poco, num ritmo de atleta. Durante todo o percurso pensei em mil coisas que hoje me dao vontade de rir. A minha maior preocupacao era adoecer... constipada, com uma alergia ou por beber agua contaminada. A meio deixei de pensar nisso. Afinal, se aquilo era sagrado nao me podia fazer mal! Felizmente, levava um impermeavel vestido (apenas por causa das chuvas da noite), mas que se revelou precioso... eh que eu nao levava sari como as outras todas mas uma blusa que ficou transparente depois de molhada, por cima de um soutien preto!
Nessa noite senti que o banho tinha, de facto, operado transformacoes em mim e no PM por arrasto. Dormimos como anjos num quarto repleto de melgas, formigas gigantes e uma familia de osgas, alem de outros insectos que nem sequer conhecemos, mas que ali passaram a noite connosco.
No dia seguinte partimos rumo a Thanjavur. A viagem de autocarro (sete horas) deixou-nos a adrenalina no maximo. Num dos solavancos, ouvimos um estrondo na parte de tras da camioneta e o revisor faz o tipico acenozinho de cabeca indiano (abanam a cabeca de um lado para o outro, como se quisessem dizer "mais ou menos", mas querem significar "sim". Ate o percebermos, eu e o PM andamos desrorientados). O saco enorme de uma das passageiras tombou e ha caranguejos espalhados por todo o lado. Cheira a peixe... estamos na India. [AV]

Proximo post: Thanjavur